A Menina Que Engoliu o Sapo
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A Menina que Engoliu o Sapo


Dilma Bittencourt
A Menina que Engoliu o Sapo (Editora Topbooks, 2016)

SINOPSE

Ficção para jovens, esse livro é um libelo ao preconceito. Em narrativa poética, a autora reflete sobre o tempo: da existência, da ausência, da eternidade. Nele, A Menina que Engoliu o Sapo se transforma de princesa em sapo com a saída do pai-rei de casa. Tempo de procura por um casaco perdido. Metáfora para a proteção do pai, como bem relata a psicóloga Frinéa Souza Brandão na carta aos leitores, ao final do livro.


O TEMPO EM “A Menina que engoliu o Sapo”

PREÂMBULO

Tempo é sentimento, uma corda tocando o infinito. Criação de quem inventa. Invenção de quem morre.

PRÓLOGO

O tempo não tem pressa/pedra calada/dorme profundo o sono de quem ri do tempo/e implode/ o eterno.

Tempo é silêncio? Por onde anda o silêncio invisível do Tempo? Será o tempo uma ilusão? O não tempo? Por onde andava o tempo antes de sua criação?

O tempo reina/dorme/acorda/ puxa o fio do presente, ele o corta/cose o fio do passado, ele se estreita (vácuo)/estica o fio do futuro /fotografa o desejo e a dúvida (tempo de espera) .

E a menina fez do tempo um escape/refúgio de uma saudade (tempo congelado). Tempo de memória. O fio já não importava mais. Não seria o tempo uma ilusão?

Viajava no tempo presente /olho no espaço/quando ouviu sua própria voz no passado: pai, você guardou o meu casaco? A menina chora o futuro sem resposta. (tempo de silêncio) .O presente, uma incógnita (não tempo).O passado distante(vazio).O futuro desejo (interrogação).

Não sei se me desapego da saudade (tempo presente, passado, futuro). Ou se abraço a lembrança(tempo de memória).

Dois tempos: o pai dizendo: A vida me ensinou os dois tempos: a esperança é o desejo do presente e a fé no futuro (tempo mental de quem não se interroga, sente.)Em oposição a este, a menina tem dúvida (tempo de inquietude), quando procura pelo casaco, metáfora para a proteção do pai.

Imagem do tempo: fotografia e resgate da imagem familiar, das atitudes e consequências dessa relação. Tempo de Histórias; Tempo que povoa os fantasmas, inseguranças , dificuldades de relacionamento da mãe. Desconfiança, onde ela confunde o tempo de ficção (marido escritor) com o tempo real. E fantasia a sua condição de personagem.

Procurando o tempo. É o tempo inexistente. O relógio parou. A menina só ouve o tique taque das horas internas. “O silêncio suspira, chora, grita, a vida é sombra de um corpo, de um cérebro. Sem asas, sem pernas, o tempo e a menina se fecham no vazio.”

Máquina do tempo: Tempo de reflexão da menina em relação a mãe: tempo sem tempo, tempo sem memória, tempo afobado, calado ou, quem sabe, culpado”(tempo invisível: a menina escapa da mãe como um átomo).

Incógnita do tempo: A mãe desenha em um bilhete ao vento outro rosto, sem as marcas da intolerância, vaidade, preconceitos e desconfianças. Tempo de confissão dos erros e expectativa de perdão .” Hoje o tempo me revela só, com a incógnita, se ainda há tempo” .

Tempo e não tempo: “Seria ele testemunha da vida, testemunha da eterna dança da existência? Do vazio e do espaço? ’’ Tempo, criação de quem vive e invenção de quem morre”?

Tempo encouraçado: De busca, de amadurecimento e dos questionamentos. A menina tentava descobrir uma flor e chorava descobrindo uma pedra. Quando não ouvia nem o tempo e nem o espaço. Brincava de futuro como se passado fosse, na ilusão de um tempo e de um espaço.

Tempo de catequese: Tempo de prisão aos ritos religiosos obrigatórios. Tempo de rebeldia interna.

Tempos congelados: O xadrez das lembranças, da ausência, das marcas da infância se descongelam com o retorno do pai.

EPÍLOGO

“Tempo, um acorde tocando a eternidade”

Boa explicação para a existência do tempo. (tempo incriado). Por ser ele eterno. Quando todos desaparecem, ele continua tocando a sua própria existência.




PREFÁCIO

A menina que engoliu o sapo fala do tempo, dos tempos, tempos internos, íntimos. A primavera que vai longe quando da partida do pai, o longo inverno do silêncio, da solidão e da ausência do pai e, finalmente, o verão da certeza do retorno da figura paterna. Tempos de fora também, de sementes e de flores, de frio e de calor. No texto, tudo conspira para falar do tempo, interrogação primeira, fundamental, filosófica. O tempo que é natural e cíclico, o tempo que é pessoal e denso falam juntos, acerca do ser da menina. Desvendam aos poucos que a pretensa dicotomia entre ambos não existe, o fora e o dentro não se distinguem, a natureza e a menina caminham em comunhão para o verão da certeza, que também é a certeza da volta do verão-pai. Em sua obra literária, a autora responde através da arte a uma das mais profundas questões filosóficas: o tempo, que para os gregos antigos tinha um caráter intrinsecamente natural e era visto como um ciclo e um eterno retorno, era sentido por Santo Agostinho como uma entidade dificilmente decifrável, visto que depende do estado emocional de cada um. Pode passar rápido quando estamos entretidos, ou lentamente, quando estamos entediados. Parece nem sequer existir, já que o que se foi ficou no passado, posto que o futuro ainda não é, e o presente apenas existe no instante fugaz...

O tempo se apresenta como um mistério, que só encontra solução na experiência da volta das flores ou na realidade do corpo da menina-sapo, que cresce com a ausência do pai. A menina que engoliu o sapo de ver seu pai partir, de conviver com uma mãe preconceituosa e amarga, responde ao tempo com um saber quase oriental, taoista: fora e dentro são um. Assim, a arte literária mostra sua sabedoria e faz filosofia.


Clara Acker
Doutora em história da filosofia pela Universidade de Paris IV – Sorbonne



CARTA AO LEITOR

Carta para a autora e para todas as meninas, pequenas ou não...
E também para os meninos, embora não seja diretamente endereçada a eles.

Rio, 13 de fevereiro de 2015

Minhas caras meninas,
Algumas de nós, meninas, somos princesas.
Andamos por castelos enormes, cheios de labirintos e corredores. Às vezes andamos lentamente, às vezes velozmente. Muitas vezes só andamos para assustar.

Quem sabe o susto é preferido por si, pelo que ele é, do que por outras surpresas? Quando procuramos o susto, temos o controle. Nós o comandamos, já que não conseguimos comandar nossos pais.

Quantos sapos nós, meninas, engolimos! Diante de cada espelho, um sapo diferente. Cada espelho é um tempo, como diz a menina autora, cada espelho reflete um momento que não se pega, não se discute. Só resta se entregar a ele, senão fica como a menina mãe, na ilusão de controle, com seus traços no rosto marcados, como a menina filha sentencia. A menina mãe que dá a voz. A menina mãe, que pergunta em dor embalada por sons e música, como deve ser todo drama. Mas, por um homem? Como você me troca por um homem? Eu, mulher? Eu, mulher, que fico no vazio, atravessando.

A menina filha, conduzida pela mão da menina autora, fica com seu casaco, casaco/pai, proteção. A menina autora nos conduz através dos sentimentos da menina filha e nos coloca, todas, dentro dela. Ela nos faz sentir a dor em cada aresta de vento que toca sua pele frágil; essa poesia escrita e musicada entre linhas nos faz vibrar nesse diapasão.

A menina filha aproveita e vê a vida e ouve outros, nas voltas desse inconsciente atemporal. Pode ouvir os pais antes de ele ir, pode ouvi-los depois que ele e seu casaco se foram. Ficou somente a referência do vazio, da falta da proteção, do casaco. Aí ela se sente o sapo sem o encanto do rei, enfeitiçada pelo fel da rainha.

A menina filha, levada para dentro de nós pela menina autora, acorda novamente com a memória quente de congelamento, com o pai presente num sussurro e o casaco de volta. Como a menina autora nos leva nesse concerto/poema/história, essa menina filha somos todas nós. Parte nascente do nosso eu ideal, construído por passagens imaginárias, desenhos incompletos e retalhos de sons. Somos o que tememos dessa menina mãe, que perde a feminilidade, e congelamos na amargura de impedir que os filhos cresçam. Assim, desconhecemos a plasticidade e apoiamos a plástica narcísica.

Somos esse casaco que achamos que temos e achamos que perdemos. Esse pai querido e temido pela ausência da representação do que traz de fora, como é sua função, mais que responsabilidade. Esperamos que, para sempre, um casaco nos cubra, aconchegue, proteja, enquanto formos meninas, enquanto estivermos meninas...

Frinea S. Brandão
Psicóloga clínica e psicanalista